segunda-feira, 3 de maio de 2010

As coisas deveriam acontecer dessa forma.


Descansando na soberania de Deus

Mt 26: 26-75 (54)
Penso que nenhum de nós tem dificuldade em afirmar a doutrina da Soberania de Deus. Está categoricamente claro nas Escrituras que nosso Deus governa sua criação com poder, justiça e sabedoria. Nada escapa ao seu controle. Todavia, há uma discussão acerca desse tema motivado pelas tragédias, como: oacidente com o avião da TAM, no aeroporto de Congonhas (18/07/07), em que morreram 199 pessoas; ou, o devastador Tsunâmi (26/12/04), que vitimou pelo menos 220 mil pessoas.Daí o debate que tem sido travado entre duas correntes teológicas:
- A Teologia Relacional, também conhecida como Teologia Aberta, Teologia do Processo ou Teologia da Autolimitação Divina. Ela ensina que Deus, no início da criação, teria aberto mão de sua Soberania e Onisciência a fim de, em sociedade com o homem, construir a história e estabelecer relacionamentos verdadeiros. Dessa forma, vêem as tragédias como acontecimentos que fogem ao controle de Deus. Ele não pode evitá-las. Na verdade, segundo os proponentes desse pensamento, Deus sofre diante das catástrofes com o mesmo sentimento de impotência que se nos impõe quando somos atingidos por elas.
- A Teologia Reformada sustenta a Soberania de Deus, mesmo em meio às mais absurdas tragédias. A Confissão de Fé de Westminster afirma: “pela sua sábia providência, segundo a sua infalível presciência e o livre e imutável conselho da sua própria vontade, Deus, o grande Criador de todas as coisas, para o louvor da glória da sua sabedoria, poder, justiça, bondade e misericórdia, sustenta, dirige, dispõe e governa todas as suas criaturas, todas as ações e todas as cousas, desde a maior até a menor”. De acordo com esta confissão, não há como imaginar alguma coisa da qual se possa dizer que tenha acontecido sem antes ter passado pelo crivo de Deus.
Ora, quantos de nós não teríamos vivenciado histórias dramáticas em nossa vida ministerial? Quantas situações sinistras poderiam ser compartilhadas. Experiências sentidas por homens e mulheres de Deus que, não obstante a sua dedicação e amor à causa do Senhor, são vítimas de injustiças, de calúnias, de perseguições, de traições, de privações, de enfermidades e outros sofrimentos. Como, pois, sustentar a doutrina da Soberania de Deus à vista dessas coisas?
Mateus 26: 26-75 concilia as duas noções. É a narrativa dos instantes que antecederam a cruz. Aqui, fica absolutamente claro que a vontade do Pai está sendo executada. Os versículos 31, 54 e 56 salientam que todas as coisas estavam acontecendo para que se cumprissem as Escrituras. O que significa que fazer a vontade de Deus não é uma garantia de isenção de sofrimentos e que sofrimentos nem sempre são indicativos de que alguém não esteja fazendo a vontade dEle. Porque aqui Jesus se submete totalmente à vontade do Pai e, no entanto, prova as mais amargas experiências:
  • Experimenta a dor da traição, ao ver aquele em quem investiu seu tempo, seu afeto e cultura e com quem compartilhou sua vida, trair sua amizade e lhe apunhalar pelas costas.
  • Experimenta o pavor da morte que se avizinhava.
  • Experimenta o abandono dos amigos que não lhe foram solidários quando deles precisou.
  • Experimenta a frustração ao ver Pedro, seu discípulo, agir como um mundano e lançar mão da espada, contrariando todos os ensinamentos que dele recebera ao longo dos últimos três anos.
  • Experimenta a frustração ao ver a negação de um dos melhores amigos que, diante de uma situação pública, afirma jamais tê-lo conhecido, não ter com ele a menor relação, não guardar a lembrança de nenhum encontro.
  • Enfim, experimenta as mais horríveis humilhações, zombarias e as mais lancinantes dores físicas.
Se Jesus sabia que passaria por tudo isso, por que se submeteu à vontade do Pai? Jesus se submeteu à vontade do Pai porque descansava nEle. Quando Pedro golpeou o servo do sumo sacerdote, cortando-lhe a orelha, Jesus lhe disse: “Guarde a espada! Pois todos os que empunham a espada, pela espada morrerão. Você acha que eu não posso pedir ao meu Pai, e ele não colocaria imediatamente à minha disposição mais de doze legiões de anjos? Como então se cumpririam as Escrituras que dizem que as coisas deveriam acontecer desta forma?”, vv. 52-54 - NVI.
Isto é descansar na SOBERANIA de Deus: É desistir de lutar com as próprias armas! É aceitar a liberdade de Deus de usar os instrumentos que pensamos que não usaria e de não usar os instrumentos que pensamos que usaria. Enfim, é saber que todas as coisas, em última instância, cooperam para nosso bem, mesmo aquelas que se nos apresentam com cara de absurdo. Cristo descansava na Soberania de Deus e isso implicou:

Na maneira como reagiu às pessoas -
vv. 32, 46, 50.
Jesus sabe que “as coisas deveriam acontecer desta forma”. Por isso, não deixa o coração adoecer por conta das pessoas que entende serem instrumentos de Deus para execução dos seus planos. Vejamos:
- Em relação aos seus discípulos, v 32. Sabe que seráabandonado por eles, mas, mesmo assim quer reencontrá-los após a ressurreição.
- Em relação a Judas, v 50. Não o desconsidera por conta do seu lapso. Dizem os estudiosos que o Jardim do Getsêmani pertencia a um dos discípulos e era o lugar dos seus encontros particulares. Judas, não respeita isto, expõe aquele lugar, lidera uma multidão armada com espadas e porretes. Quando se aproxima dele “lasca-lhe” um beijo. Segundo comentaristas bíblicos foi um espetáculo esmerado de afeição. Jesus olha para ele e lhe chama de amigo. Jesus estava sendo cínico? Creio que não. João 13.1 diz: “Tendo amado os seus os amou até o fim”.
- Em relação aos que o crucificaram. É capaz de um ato de bondade, mesmo quando o objeto dessa bondade é o servo do sumo sacerdote enviado para lhe prender, Lc 22: 52. Uma das palavras da Cruz, foi: “Pai, perdoa-lhes porque não sabem o que fazem”, Lc 23: 34.
Quantos “traumas” são curados quando olhamos para a vida nessa perspectiva. José entendia dessa forma. Quando seu pai morreu seus irmãos ficaram preocupados imaginando que ele lhes retribuiria o mal que lhe fizeram, no entanto, José faz uma das mais lindas confissões acerca da soberania de Deus: “Vós, na verdade, intentaste o mal contra mim; porém Deus o tornou em bem, para fazer, como vedes agora, que se conserve muita gente em vida”, Gn 50: 20.
No modo como entendeu a não intervenção
sobrenatural do Pai – v. 53.
É impressionante a declaração de Jesus, no versículo 53:“Acaso, pensas que não posso rogar a meu Pai, e ele me mandaria nesse momento mais de doze legiões de anjos?”. Uma legião romana era composta de seis mil soldados. Logo, 12 legiões correspondem a 72 mil anjos. Ou seja, Jesus sabia que os céus podiam livrá-lo daquele momento, se fosse o caso.
Em quantas outras ocasiões Deus visitara o seu povo por intermédio dele? Curando enfermos, exorcizando demônios, acalmando tempestades, ressuscitando mortos. Por que Deus não interveio em seu favor naquele momento? Tenho entendido duas coisas:
a) Deus tem o tempo certo para intervir em nossa vida. Na história de Jesus, o tempo certo seria o terceiro dia. Ele tinha de passar por tudo aquilo. Tinha de morrer pelos nossos pecados. Porém, sabia que o Pai não “deixará a minha alma na morte, nem permitirá que o teu Santo veja corrupção”, Sl 16: 10.
b) Há situações nas quais Deus não intervém da formacomo pensamos, 2Co 12: 7. Paulo orou três vezes por conta de um “espinho na carne” e a resposta que obteve de Deus foi: “a minha graça te basta”. Crer na Soberania de Deus me permite olhar para Ele sem desconfianças mesmo diante das situações mais “incoerentes” da minha vida. Cristo descansava na soberania de Deus.
Na forma como sustentou suas convicções - v. 64.
O principal motivo pelo qual os judeus o prenderam foi a sua alegação de que era o Filho de Deus. Quando o sumo sacerdote lhe disse: “Eu te conjuro pelo Deus vivo que nos diga se tu és o Cristo, o Filho de Deus”, ele respondeu: “Tu o disseste; entretanto, eu vos declaro que, desde agora, vereis o Filho do homem assentado à direita do Todo-Poderoso e vindo sobre as nuvens do céu”.
Ele foi capaz de sustentar sua fé:
a) Diante de sacerdotes furiosos. Diante de soldados agressivos. Diante de uma multidão hostil;
b) Mesmo quando os discípulos não sustentaram a mesma convicção. Pedro é um exemplo de alguém capaz de discursos inflamados em ambientes religiosos, contudo, de atitudes covardes em ambientes “seculares”;
c) Mesmo diante da pressão da morte. Mesmo na expectativa de que sua fé poderia levá-lo a morte, Ele afirma: “Eu sou o Cristo”.
Não temos sido valentes de mais nos ambientes religiosos e tímidos demais nas “segundas-feiras” da vida?

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